A lenda do galo de Barcelos já é muito antiga. Diz-se
que tudo aconteceu no séc. XVI...
Conta a lenda que todos andavam muito assustados em
Barcelos por causa de um crime que lá se tinha passado. É que o criminoso ainda
não tinha sido descoberto e isso deixava as pessoas com medo.
Certo dia, apareceu na zona um galego (espanhol da
região da Galiza) que passou logo a ser o principal suspeito. As autoridades
acharam que era ele o culpado pelo crime e prenderam-no.
O galego defendeu-se, dizendo que ia a caminho de
Santiago de Compostela para pagar uma promessa, mas ninguém acreditou nele...
Com toda a gente contra o galego, e ele sem poder
provar que estava inocente, acabou por ser condenado à forca.
Como última vontade, o galego pediu que o levassem até
ao juiz que o tinha condenado. Quando o galego chegou a casa do juiz, ele
estava a deliciar-se com os amigos com um grande banquete. Voltou a dizer que
estava inocente, mas, mais uma vez, ninguém acreditou nele...
Então, o condenado reparou num galo assado que estava
numa travessa na mesa, prontinho para ser comido, e disse:
- É tão certo eu estar inocente como certo é esse galo
cantar quando me enforcarem.
Todos se riram da afirmação do homem mas, mesmo assim,
resolveram não comer o galo.
Mas, quando chegou a hora de enforcarem o galego, na
casa do juiz o galo assado levantou-se e cantou.
Afinal, o homem estava mesmo inocente!
O juiz correu até ao sítio onde ele estava prestes a
ser enforcado e mandou soltá-lo imediatamente.
Passados alguns anos, o galego voltou a Barcelos e
mandou construir um monumento em louvor à Virgem e a São Tiago para lhes mostrar
o seu reconhecimento.
Recolha feita por Gabriel Trabulo e Matilde Collaço.
Lenda dos sete ais
Esta é uma lenda estranha que está na origem do nome
de um local do concelho de Sintra e que remonta a 1147, data em que D. Afonso
Henriques conquistou Lisboa aos Mouros.
Destacado para ocupar o castelo de Sintra, D. Mendo de
Paiva surpreendeu a princesa moura Anasir, que fugia com a sua aia Zuleima. A
jovem assustada gritou um "Ai!" e quando D. Mendo mostrou intenção de
não a deixar sair, outro "Ai!" lhe saiu da garganta. Zuleima, sem lhe
explicar a razão, pediu-lhe para nunca mais soltar nenhum grito do género, mas
ao ver aproximar-se o exército cristão a jovem
soltou o
terceiro "Ai!".
D. Mendo decidiu esconder a princesa e a sua aia numa
casa que tinha na região e querendo levar a jovem no seu cavalo, ameaçou-a de a
separar da sua aia se ela não acedesse e Anasir deixou escapar o quarto
"Ai!".
Pouco depois de se instalar na casa, a princesa moura
apaixonou-se por D. Mendo de Paiva, retribuindo o amor do cavaleiro cristão que
em segredo a mantinha longe de todos.
Um dia, a casa começou a ser rondada por mouros e
Zuleima receava que fosse o antigo noivo de Anasir, Aben-Abed, que apesar de na
fuga se ter esquecido da sua noiva, voltava agora para castigar a sua traição.
Zuleima contou a D. Mendo que uma feiticeira lhe tinha
dito que a princesa morreria ao pronunciar o sétimo "Ai!".
Entretanto, Anasir curiosa pela preocupação da aia em relação aos seus
"Ais", exprimiu o quinto e o sexto consecutivamente, desesperando a
sua aia que continuou a não lhe revelar o segredo.
D. Mendo partiu para uma batalha e passados sete dias
foi Aben-Abed que surpreendeu Anasir, que soltou o sétimo "Ai!", ao
mesmo tempo que o punhal do mouro a feria no peito.
Enlouquecido pela dor, D. Mendo de Paiva tornou-se no
mais feroz caçador de mouros do seu tempo.
recolha feita por Marta Jorge e Leonor Pedro
A Lenda do pastor e da estrela
Era um pobre pastor. Vivia numa aldeia triste e tinha
como único amigo o seu cão. Mas o homem era novo e tinha esperanças. Às vezes,
fitava os horizontes e perguntava a si próprio:
— Porque razão não poderei atravessar aquelas
serras?... Ir ver o mundo que fica do outro lado? Ah! Hei-de ir um dia...
hei-de ir! Isto aqui é pequeno para mim… e aquelas serras são tão grandes...
tão altas!... Que haverá para além das montanhas?...
Ora aconteceu, segundo conta a lenda, que certa noite
o pastor, enamorado do luar e da aragem fresca que corria de mansinho, nem
sequer pensou em deitar-se. Ficou-se para ali, sentado, sonhando de olhos
abertos... E, a determinada altura — fosse realidade ou sonho — teve a nítida
impressão de que uma pequenina estrela descia até ele. Nessa estrela havia um
rosto de criança. E a estrela falou-lhe, numa voz meiga e infantil:
— Pastor! É verdade que desejas ir conhecer o mundo?
Não tens medo do desconhecido?
Surpreendido, o homem estremeceu.
— Meu Deus! Pois será possível que as estrelas tenham
voz?
A vozinha meiga e infantil fez-se ouvir de novo:
— Sim, sou eu que te falo... Mas foi Deus que me
enviou para te guiar! Quando quiseres, poderemos partir!
Uma alegria imensa tomou de assalto o jovem
pastor.
— Partir?! Disseste que podemos partir?... Ah! Quem me
dera, realmente, deixar tudo isto e correr aventuras, descobrir novas terras!
Quem me dera!...
O pastor ficou-se extático, ouvindo o seu próprio
desejo, mas a vozinha da estrela brilhante que descera do Alto interrompeu-lhe
o êxtase, lembrando-lhe com vivacidade:
— Meu bom amigo! Já te disse que tudo depende apenas
da tua vontade. Quando estiveres disposto a partir, basta que chames por mim.
Eu ficarei à tua espera, lá em cima... junto das minhas irmãs. Adeus,
pastor!
E correndo, ligeira, a estrelinha foi juntar-se às
outras estrelas.
O pastor seguia-a com o olhar. Mal podia acreditar no
que vira e ouvira. A verdade, porém, é que a estrelinha brilhante não mais o
abandonou. O pastor todas as noites a via, mais luminosa do que as outras,
parecendo até sorrir-lhe. E ele acabou por se resolver à grande aventura.
Uma noite em que o luar não tinha ainda chegado, o
pastor olhou o céu e falou assim:
— Oh, minha pequenina estrela! Fosse loucura ou
verdade, eu ouvi a tua voz. Pois estou decidido! Que se faça a vontade do
Senhor!... Irei à aventura até alcançar aquela grande serra que vejo além, a
maior de todas? Oh, minha boa estrela! Desce do céu e vem para me
guiares!...
Então o pastor ouviu uma espécie de estranha melodia
descendo sobre ele. E de novo o pastor escutou aquela vozita cheia de ternura que
já ouvira uma vez:
— Aqui estou! Sabes que cheguei a pensar que não
acreditavas em mim? Mas ainda bem que te resolveste!
— Então... a caminho!... Seguir-te-ei para onde tu
quiseres!
E, assim dizendo, o pastor dispunha-se já a dar início
à sua jornada, quando um obstáculo surgiu. O cão, fiel companheiro do pastor,
sentiu decerto uma presença estranha junto dele. Era a estrela! E o cão ladrou
na noite escura, pondo em sobressalto toda a aldeia!
Aflito com tamanha irreverência, o pastor apressou-se
a impor-lhe silêncio:
— Quieto! Quieto... aqui! Para que ladras tu? A
estrela é nossa amiga... Vai levar-nos àquela serra. Vês? Vamos, acalma-te!
Ninguém te faz mal!...
Aos poucos, o cão acalmou, e seguiu mansamente o seu
dono pelos caminhos do desconhecido.
Na aldeia, os velhos ficaram abanando as sábias
cabeças. Era um louco que partia! Fora dali, só poderia encontrar a fome, a
miséria e a morte!
De facto, eles quase tinham razão. Durante tempos e
tempos o pastor andou como que ao acaso, sem alcançar o seu destino. Foi uma
caminhada longa e dura. O alto da serra ficava sempre mais além, e o caminho,
que julgara curto, parecia não ter fim. Eram voltas e voltas sem conto. Eram
dias e meses passando como fantasmas, sem que o pastor alcançasse o almejado
cimo da serra.
O cão, seu fiel companheiro, não conseguiu aguentar a
jornada. Ficou no caminho, marcado por tosco sinal de pedra. O pastor, antes de
o abandonar, olhou a terra fria, enquanto algumas quentes lágrimas tentavam
aquecê-la e disse:
— Deixo-te aqui... Tu foste o meu fiel e único amigo!
Onde me levarão os meus passos? Não sei! Conseguirei eu alcançar aquela serra?
Só Deus o sabe! Adeus, meu amigo! O teu destino parou. O meu tem de continuar!...
E silenciosamente seguiu rumo ao alto da serra, o
pastor que um dia sonhara abraçar de lá todo o horizonte.
Muitos anos passaram. O pastor envelheceu — e a
própria estrela também, segundo nos conta a lenda...
Porém, um dia — esse dia havia de chegar! — o pastor
pôs o pé no alto da serra! A alegria que sentiu foi quase de loucura. Olhava em
redor o vasto e belo horizonte, e a cabeça parecia estalar-lhe. Chorava e ria
ao mesmo tempo. Gritava por entre o vento o seu hino de louvor:
— Bendito seja Deus! Bendita sejas tu, minha boa
estrela!... Chegámos!...
E o vento, rodeando as palavras do velho, resolveu
subir com elas, cheio de cuidado, não fosse perder-se alguma, até lá onde os pés
do homem não podem chegar...
Ouvindo-o, a
estrela sorriu-lhe e disse:
— Meu bom pastor! Passaste, na verdade, muitos
tormentos... Envelhecemos ambos... Mas Deus fez-te a vontade!
Então, dominando o espaço, a voz do pastor soou
potente e convicta:
— Aqui ficarei para sempre na tua companhia! Para
sempre!
E o pastor instalou-se ali, mergulhando, deliciado, o
seu olhar na amplitude vasta do horizonte.
Então aconteceu que o rei daquelas redondezas ouviu
falar num pastor que habitava no alto da serra e que possuía uma estrela única
no mundo com quem falava todas as noites. Sem hesitar, mandou emissários para que
o trouxessem à sua presença.
Quando o velho pastor, um tanto surpreendido, chegou
ao palácio do rei, este elucidou-o sobre o seu intento:
— Ouve, pobre velho! Dar-te-ei todas as riquezas que
quiseres... farei de ti um homem poderoso para o resto da vida! Em troca, quero
apenas que me dês a tua estrela!
O velho pastor olhou o rei com desespero.
— Pedis o impossível, Senhor! A estrela não é minha, é
do Céu!
Furioso, o rei gritou-lhe:
— Que importa? Eu sei que ela faz o que tu ordenas... Se
tu quiseres, ela será minha!
Com uma dignidade que assombrou o monarca, o velho
pastor replicou:
— Senhor, prefiro continuar pobre, desprezado, mas
sempre com a minha estrela!
E no mesmo assomo de energia, o velho pastor voltou as
costas ao rei poderoso, e abalou de novo a caminho da serra.
Quando lá chegou, a noite ia já alta. Ele atirou-se
para cima da enxerga e mordiscou uma côdea de pão negro. Então, a tal estranha
melodia já muito sua conhecida desceu do alto e veio sussurrar-lhe aos ouvidos:
— Ainda bem que as riquezas não te tentaram!...
Ficaria tão triste! Deixei-te passar misérias para te expor ainda mais à
tentação, mas confesso que receei muito! O rei ofereceu-te verdadeiros tesouros...
Erguendo-se da enxerga para onde o cansaço do corpo o
tinha atirado, o velho respondeu com lágrimas na voz:
— Ouve, minha boa estrela! Já perdi a conta dos anos.
Nem sei desde quando nos conhecemos... Mas quero que fiques sabendo que não
poderei viver sem ti, sem a tua luz, sem o teu brilho, sem a tua presença!...
A estrela explicou-lhe, num sussurro, fazendo amainar o
vento que corria célere:
— Pois quando morreres, meu bom pastor, podes morrer
descansado! Eu aqui te prometo que jamais te abandonarei!
Num êxtase, o pastor encarou a sua estrela. O seu
brilho intenso salpicava-lhe de luz os cabelos encanecidos. E o velho, numa voz
de profeta, proclamou do alto das montanhas:
— Eu te agradeço o que fizeste por mim! De hoje em
diante esta serra há-de chamar-se, e para sempre — a serra da Estrela!
E diz a lenda que no alto da serra desse nome pode
ver-se todas as noites, entre as suas irmãs, uma estrela que brilha ainda hoje
duma maneira estranha e diferente. O seu brilho derrama reflexos de saudade e
de amor sobre a campa desconhecida daquele que foi e continuará a ser — o seu
pastor!
recolha feita por
Francisca Mesquita
LENDA DE VILA DO CONDE E
DO RIO AVE
Era uma vez um Conde que
vivia numa terra situada à beira- mar.
Certo dia partiu para
caçar e acabou por ficar numa serra cuja paisagem o fascinou.
Era uma serra calma, com
árvores aqui e além, dando ao local um aspeto belo e acolhedor, de vez em
quando quebrado pelo chilreio das aves.
Andava o Conde a caçar
quando foi surpreendido por uma imagem deslumbrante...
Uma bela e angélica
pastora guardava um rebanho de cabras. O Conde depressa se enamorou pela
formosura da pastora e ela correspondia inteiramente ao amor do
Conde.
Mas o Conde tinha que
regressar à sua terra e a pastora estava tão triste, tão triste que disse
ao seu amado Conde, que adoraria ser ave para poder voar, para ir
visitá-lo... Despediram-se e a bela pastora chorou tanto, tanto que as
suas lágrimas formaram uma nascente, que correu até à terra situada à
beira-mar onde vivia o
seu Conde.
É esta lenda do Rio Ave
que nasce na Serra da Cabreira e desagua em Vila do Conde.
recolha feita por
Gabriel Paraíba
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